Pesquisar este blog

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Rose Domingues: "Ser repórter, uma paixão"

Hoje acessando o blog referência para os jornalistas da terrinha, o Pauta Quente, saboreei esse texto da amiga jornalista Rose Domingues, uma das mais sensíveis por aqui. Me reconheço em muitas de suas palavras, Rose. Para mim, ser repórter é o mais bonito de tudo, hoje continuo sendo repórter, mas de um jeito diferente, nem sempre escrevo as histórias que ouço diariamente, mas as reproduzo para meu interior, vejo como lições preciosas, sempre tentando evoluir. Minha alma é repórter. Com muito orgulho. Valeu pela reflexão, Rose!



"Eu diria mais, ser repórter da editoria de cidades: uma grande paixão. Ao remexer o baú de lembranças, recordo-me da minha primeira semana de trabalho entre os veteranos Anderson Pinho, Najla Passos, Janã Pinheiro, Keka Werneck, Ana Drummond e da editora Nadja Vasques. Pessoas cujo trabalho eu acompanhava nos jornais. Eles eram meus ídolos! Que medo. As reuniões de pauta geralmente eram movimentadas, com direito a porta esmurrada, palavrões, não havia ‘sim, sim, não, não’. As ordens da chefia não eram acatadas mansamente, existiam debates, críticas e até brigas pelo meio da redação. Grandes reportagens, brilhantes ideias, sobrava motivação. Orgulho-me de ter convivido com excelentes profissionais no meu início de carreira e ter construído minha referência de quem ser em meio ao mercado de trabalho. Infelizmente as redações afugentaram esse tipo de debate, esse tipo de gente, gente com perfil de jornalista.

O bom mesmo de ser repórter é estar na rua fazendo a pauta. É ouvir histórias, entrar na casa de ‘marias’, ‘joões’, gente simples, mas cheia de sabedoria, simpatia e generosidade. Virtudes que nenhum dinheiro ou conhecimento pode comprar. Orgulho-me dos anos em que fiz a cobertura das campanhas Natal da Solidariedade e Viva Seu Bairro, do jornal A Gazeta. Não cabe aqui as discussões ideológicas de ‘dar o peixe’ ou ‘ensinar a pescar’. Adquiri muita experiência de vida ao me deparar com homens, mulheres e crianças passando fome. Ver, sentir, tocar é diferente de apenas ler e escrever sobre estatísticas. Aquilo ali é a vida real de milhares de brasileiros: a fome. Obviamente, essa gente carece de mais que ‘pão e circo’, ou Bolsa Família, eles precisam de escola boa, lazer, arte, necessitam acalentar mais sonhos. Porque, como poeticamente dizia Fernando Pessoa, ‘matar o sonho é matarmo-nos. É mutilar a nossa alma’. E o que mais existe por aí são brasileiros mutilados. A violência só tende a aumentar mesmo.

Lembro-me de uma senhora, ela vivia em um barraco no Novo Paraíso 2, o esgoto corria a céu aberto, as crianças estavam todas nuas, sujas, o catarro escorria pelo rosto. Em sua simplicidade, ela nos abriu a porta com um sorriso desdentado. Os cabelos crespos desalinhados, a roupa rasgada e suja. O odor que exalava do ambiente era desanimador, mas justificado: a família não tinha banheiro, nem noções de higiene, claro. Qual não foi minha surpresa ao saber a idade da entrevistada: 24 anos. O rosto estava tão marcado pelas rugas que ela aparentava mais de 50 anos, porém ela era mais jovem que eu, com 27 anos na época! Como poderia me esquecer da minha ‘cliente’ mais insistente, a Rosicléia, do bairro Pedra 90? Na nossa primeira matéria, a equipe de reportagem ficou muito emocionada, pois a jovem havia dias estava oferecendo água com açúcar para as filhas pequenas no café da manhã. A história emocionou muito os leitores, que fizeram doações em peso, inclusive houve doações de pessoas de outros países!

Tenho especial carinho por uma matéria que fiz junto com o fotógrafo Chico Ferreira. Nós viajamos para Jangada em busca de parteiras. Mesmo tendo amanhecido nublado naquele dia, nós encaramos a estrada em busca de personagens nas vilas e sítios da região. Foi uma experiência linda porque nos deparamos com ensinamentos ricos em sabedoria repassados de geração em geração. Nas casinhas de palha, chão batido, sem energia elétrica, as famílias em geral dormiam em redes, que ficavam dispostas uma ao lado da outra. Nem todas as crianças tinham registro ou cartão de vacina. Uma comprovação de que os serviços públicos não chegam a todos os mato-grossenses, como dizem as autoridades. Ganhei uma menção honrosa por esta reportagem e me sinto realizada ao me lembrar dela; não pelo prêmio, mas pela paixão de estar no lugar certo, na hora certa, fazendo o que amo fazer: contar histórias.

A gente sempre brincava dizendo que repórter de cidades não ganha dinheiro porque, ao contrário dos demais colegas, cuja rede de contatos compreende políticos, empresários, chefes de Estado, nosso foco é o povo: pobres, presidiários, sem-terra, gays, mulheres espancadas, crianças abusadas, um batalhão de anônimos. Mesmo quando estávamos presentes em solenidades e em entrevistas com autoridades, nosso papel era o mais chato de todos: cobrar, cobrar e cobrar melhorias. Por outro lado, representar uma pedra no sapato dos maus gestores era maravilhoso. Cobrir manifestações, ouvir moradores sobre falta d’água, quebra-molas, mais vaga em creche, apoiar greves de todas as categorias de trabalhadores, mostrar a situação de penúria dos negros quilombolas de Mata-cavalo, o mau estado dos conselhos tutelares, a falta de remédios e atendimento na saúde pública, pisar na lama cada vez que havia enchente em Cuiabá, verificar criadouros do mosquito da dengue, e por aí vai…

Eu posso até mudar de profissão qualquer dia desses, mas jamais deixarei de ser repórter de cidades. Mesmo cansada dos embates, para onde eu olho, em todos os momentos, vejo uma pauta! Meu coração continua vivo, minha alma vibrante. O mundo é uma grande reportagem, repleta de versões para serem ouvidas e mostradas. No entanto, por que tanta informação esvaziada de razão e sensibilidade? O filósofo Khalil Gibran já dizia: “Árvores são poemas que a terra escreve para o céu. Nós as derrubamos e as transformamos em papel para registrar todo nosso vazio”. Um jornalista esvaziado de si mesmo deixa de ser um artista da engrenagem da vida, do universo, para representar apenas mais uma peça na engrenagem do veículo de comunicação. Repito, apenas".

Rose Domingues, jornalista há 11 anos, editora da revista Única

Fabrício Carpinejar: "Falso Brilhante"



"Há o condicionamento de que amor mesmo, de verdade, é gastar metade do salário para a esquadrilha da fumaça assinar o nome da namorada pelos céus de Porto Alegre.

Temos uma noção de que amor mesmo, de verdade, é exibicionista. Depende de surpresas públicas de afeto como serenata na janela, carro de som, anúncios na TV, outdoors com pedido de casamento.

Mulheres e homens se desesperam por um amor público, encantado, de estádio cheio, e cobram provas mirabolantes de seus parceiros. Reclamam da rotina, da previsibilidade, e exigem declarações barulhentas para despertar a inveja do próximo.


O amor espalhafatoso recebe a fama, mas o amor contido é o mais profundo.


Ao procurar o amor empresarial, desprezamos o amor funcionário público, que atende às ligações e escreve nossos memorandos.

Ao perseguir o amor de cinema, desdenhamos o amor de teatro, de quem encena a peça todo dia ao nosso lado, sempre com uma interpretação nova a partir das falas iguais.

Ao cobiçar o amor sensual de lareira e restaurante, apagamos a delícia de comer direto nas panelas, sem pratos, sem medo do garçom.

Ao perseguir a aventura, negamos a permanência.

Preocupados em ser reconhecidos mais do que amar, esquecemos a verdade pessoal e despojada do nosso relacionamento. Recusamos o amor constante, o amor cúmplice.

Não valorizamos a passionalidade silenciosa, a passionalidade humilde, a passionalidade generosa, a passionalidade tímida, a passionalidade artesanal.

O passional pode ser discreto na aparência e prático na ternura.

O amor mais contundente é o que não precisa ser visto para existir. E continuará sendo feito apesar de não ser reparado.

O amor real é secreto. É conservar um pouco de amor platônico dentro do amor correspondido. É reservar as gavetas do armário mais acessíveis para as roupas dela, é deixar que sua mulher tome a última fatia da pizza que você mais gosta, é separar as roupas de noite para não acordá-la de manhã. E nunca falar que isso aconteceu. E não jogar na cara qualquer ação. E não se vangloriar das próprias delicadezas.

Buscá-la no trabalho é o equivalente a oferecer um par de brilhantes. Esperá-la com comida pronta é o equivalente a acolhê-la com um buquê de rosas vermelhas.

São demonstrações sutis, que não dá para contar para os outros, mas que contam muito na hora de acordar para enfrentar a vida" - Fabrício Carpinejar

Em três dias...

A contagem é regressiva
Em três dias
Mais uma flor no meu jardim
No nosso jardim
Para trazer mais comunhão
E Alegria
Muita Alegria!